Fazenda Pública e oficial de Justiça: conflito no adiantamento de diligências.
Izaias dos Santos Silva Junior
Assistente Administrativo da 8ª Procuradoria Regional do Estado do Paraná – Umuarama, Cursando a Escola da Magistratura do Paraná – Núcleo de Umuarama
SUMÁRIO: Resumo; Introíto; 1.Fazenda pública, 1.1.Conceito, 1.2.Implicações processuais em favor da fazenda pública; 2.Dos oficiais de justiça, 2.1.Aspectos históricos, 2.2.Das atribuições da função do oficial de justiça; 3.Das classificações das despesas processuais e suas espécies, 3.1.Taxa judiciária, 3.2.Despesas processuais de natureza remunenratória; 4.Das previsões legais e seu conflito na prática processual, 4.1.Do Código de Processo Civil, 4.2.Da lei das execuções fiscais; 5.Da justiça estadual local, 5.1.Das competência, 5.2.Das atitudes da justiça estadual local na solução do conflito; Conclusão; Bibliografia
RESUMO
O presente trabalho demonstra a existência dos conflitos tanto na esfera da "Lei Processual" quanto na "Aplicação dessa Lei Processual", especificadamente no que tange ao adiantamento de diligência do Sr. Oficial de Justiça pela Fazenda Pública. Descreve, ainda sobre a conceituação da Fazenda Pública e os seus privilégios processuais; bem como do surgimento do cargo do Oficial de Justiça e as suas atribuições. As classificações das espécies das despesas processuais. Encarta, também sobre as previsões legais que pertinem ao conflito, bem como a competência da Justiça Estadual e as atitudes para a solução do conflito.
INTRÓITO
Nos dias atuais o presente tema tem gerado infinitas discussões nos Tribunais sobre se o privilégio Fazenda Pública abrange o não adiantamento da diligência do Sr. Oficial de Justiça.
Deste modo, o nosso Código de Processo Civil em seus artigos 19 e 27, estabelecem como regra geral algumas diretrizes sobre os privilégios da Fazenda Pública.
Por conseguinte a lei especial da Fazenda Pública, a Lei nº 6.830/80, também conhecida como "Lei das Execuções Fiscais", em seu artigo 39, também, traz privilégios sobre o pagamento de custas e emolumentos.
Por outro lado, vemos o serventuário da justiça, que no presente caso trata-se do Oficial de Justiça incumbido das suas atribuições, entre outras, deve-se realizar diligências em prol da Fazenda Pública sem o mero depósito prévio das diligências, tendo em vista as disposições da legislação vigente.
Deste modo, pelo regramento jurídico processual brasileiro, deve-se estabelecer diretrizes para que a finalidade dos processos judiciais das Fazendas Públicas sejam alcançados, não ficando nos Tribunais Superiores aguardando decisões sobre o pagamento de uma despesa necessária para o cumprimento da obrigação do Sr. Oficial de Justiça.
Nesse sentido, a Corregedoria Geral da Justiça, na pessoa do Corregedor Geral da Justiça, estabeleceu o Provimento nº 48 da Corregedoria Geral da Justiça, regulando os procedimentos a serem observados nos casos que envolverem a Fazenda Pública.
1 DA FAZENDA PÚBLICA
1.1 Conceito
A Fazenda Pública é normalmente citada como representante do patrimônio das pessoas jurídicas de direito público interno, tanto mais quando observadas sob a sua atuação judicial (1): são a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os municípios. Somam-se as respectivas autarquias que, mesmo componentes da Administração indireta, conservam a natureza do ente formador, inclusive as fundações públicas que a elas se equiparam.
Para melhor explicar, a palavra "fazenda", a princípio, significava coisa que se faz ou foi feita. Passou a chamar-se "fazendas" às manufaturas, obras ou produtos, e como fossem eles objeto do comércio como sinônimo de "mercadorias", "gêneros" ou "bens" transportados ou amealhados ou que podiam ser transformados em riqueza. Por antonomásia, passou a designar a repartição de finanças do Estado, chamadas Fisco ou Tesouro, que cuidava de seus haveres, bens, produtos, reditos, rendas, contribuições, créditos tributários ou não-tributários: Fazenda Real, Fazenda Nacional ou Fazenda Pública.
Desta mesma maneira o Hélio do Valle Pereira (2), descreve que:
"O termo fazenda entrosa-se com o perfil econômico do ente público. A palavra, em sentido amplo, é sinônimo de patrimônio ou riquezas de uma pessoa. Seu uso mais difundido refere-se às finanças estatais, não casualmente se aplicando o vocábulo para designar a pasta que, nos âmbitos federal e estadual, cuida do dinheiro governamental, ainda que no campo municipal prefira-se a enunciação secretaria de finanças"
Com o passar dos anos, evoluiu-se para considerar a pessoa jurídica única do Estado, em que o Tesouro Público não tem personalidade jurídica distinta, mas é apenas uma repartição ou órgão daquele. No Brasil, já Carlos de Carvalho consolidara que: "União e Fazenda Nacional ou Federal são a mesma entidade (3)".
Deste modo, emprega-se, atualmente, a expressão "Fazenda Pública" para designar a União, os Estados-membros, o Distrito Federal, os Municípios e as suas autarquias, quando administradores ou gestores de créditos tributários ou não tributários (4).
1.2 Implicações Processuais em favor da Fazenda Pública
Pela multiplicidade de formas que assume a Administração, percebe-se que não poderão essas distintas facetas estar submetidas a igual regime. Incogitável, por exemplo, que a Administração Direto esteja exposta ao mesmo regramento a que estão submetidas as sociedades de economia mista (5).
Na realidade, as projeções estatais sempre ficam vinculadas a um colorido comum, a uma essência congênita. Mesmo que se trate de atividade desempenhada por particular, ainda assim algum tom de sua atuação denunciará sua vinculação pública (6).
Serão as pessoas jurídicas que congreguem o conceito de Fazenda Pública que ficarão sujeitas enfaticamente àquele especial sistema que caracteriza o direito público (7).
Não por coincidência, é em homenagem a essas peculiaridades que o direito processual civil sofre adaptações, amoldando-se na mesma medida ao regime de direito público (8).
Mas isso apenas haverá de ocorrer em relação à Fazenda Pública, conceito que limita a sua incidência às pessoas jurídicas de direito público, afastando-se todas as demais formas de expressão estatal. Não se propicia que outras entidades, mesmo nascidas e mantidas a serviço do Estado, recebam mercês processuais, que prerrogativas próprias da personalidade jurídica de direito público, submete-se ao sistema processual comum, sem exceções (9).
2 DoS OficiaIS de Justiça
2.1 Aspectos históricos
Segundo alguns historiadores, a origem do Oficial de Justiça se deu no Direito hebraico. Os Juizes de paz tinham, nessa época, alguns oficiais encarregados de executar as ordens que lhe eram confiadas (10).
No Direito Justiniano foram atribuídas ao apparitor as funções desempenhadas pelos Oficiais de Justiça atualmente (11).
No Direito Romano, inicialmente, na fase das ações da lei, o chamamento do réu a juízo ficava a cargo do próprio autor, seguindo a Lei das XII Tábuas. Onde no século V d.C., porém, generalizou-se a citação por libellus conventionis, que era executada pelo executor, o qual recebia do réu as sportulae (custas) proporcionais ao valor da causa. O réu, ao refutar a pretensão do autor, fazia chegar ao conhecimento deste o seu libellus contradictionis, por intermédio do executor (12).
O Direito francês antigo dividiu em duas categorias os auxiliares de justiça da época: os oficiais judiciários e os huissiers. Os primeiros seriam comparáveis aos escrivães e escreventes da atualidade, enquanto que os segundos se comparariam aos atuais Oficiais de Justiça (13).
Agora, em Portugal, com a instituição dos Oficiais de Justiça. Nos forais e em alguns documentos legislativos, figuram com o nome de sagio ou saion. Também eram denominados de meirinho ou meirinus (14).
Ainda, o Direito Português distinguia o meirinho mor do meirinho. O primeiro era o próprio magistrado. O segundo era o Oficial de Justiça, que era oficial dos ouvidores e dos vigários gerais (15).
No Direito brasileiro, na época do Império, os princípios fundamentais emanados de Portugal foram racionalizados. Naquela época, os juizes de direito e de paz podiam nomear e demitir livremente os Oficiais de Justiça, que recebiam emolumentos fixados para os diferentes atos em que intervinham (16).
No entanto, "somente após a Independência, por Lei de 11 de outubro de 1827, sistematizou a função do Oficial de Justiça" (17), devendo este atender os dispostos nas leis de organização judiciária e as leis processuais pertinentes.
2.2 Das atribuições da função do Oficial de Justiça
É insofismável que o Oficial de Justiça é elemento importante para a plena realização da justiça, sendo um auxiliar da Justiça no complexo dos atos processuais.
No entanto, a grande maioria dos atos processuais necessita da participação de Oficiais de Justiça para seu cumprimento, que na falta deste, pode levar a invalidade de certos feitos judiciais.
Como exemplo desses feitos está disposto no artigo 577 do Código de Processo Civil, onde dispõe:
"Art. 577 – Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz (18) determinará os atos executivos e os oficiais de justiça o cumprirão."
Insta ressaltar que a máquina judiciária não pode desempenhar seu importante papel sem a figura do Oficial de Justiça, pois este deve ser a mão(longa manus) do juiz quando realiza o ato processual, que materializa a pretensão jurisdicional das partes.
Esse entendimento foi salientado pelo Juiz Corregedor Regional Vicente José Malheiros da Fonseca, no Provimento CR n.º 06/1996 (19), onde demonstra:
"O Oficial de Justiça Avaliador, assim como qualquer servidor público, deve cuidar de sua apresentação pessoal, compatível com o cargo que exerce, na realização das diligências que lhe forem cometidas, porque os atos que executa, na qualidade de longa manus do Juiz, é a exteriorização do cumprimento de ordens emanadas pelo Poder Judiciário Trabalhista que, na administração da justiça, atua em nome da sociedade para a satisfação de direitos judicialmente reconhecidos."
Certamente, se não houvesse a participação do Oficial de Justiça, desestruturaria a máquina judiciária, pois os magistrados teriam que efetivar diretamente os atos processuais, o que seria completamente ilógico e prejudicial a todo sistema.
É evidente que o Oficial de Justiça é apenas uma das peças, no desempenho da missão da Justiça, que também conta com a participação de todo um complexo de cargos e atribuições relevantes que levam o Judiciário a cumprir seu importante papel na sociedade.
Desta maneira, pela a importância da função desempenhada, o nosso Código de Processo Civil, em seu artigo 143, estabeleceu as atribuições específicas do Oficial de Justiça:
Art. 143. Incumbe ao Oficial de Justiça:
I – fazer pessoalmente as citações, prisões, penhoras, arrestos e mais diligências próprias de seu ofício, certificando no mandado o ocorrido, com menção de lugar, dia e hora. A diligência, sempre que possível, realizar-se-á na presença de duas testemunhas;
II – executar as ordens do Juiz a que estiver subordinado;
III – entregar, em cartório, o mandado, logo depois de cumprido;
IV – estar presente às audiências e coadjuvar o juiz na manutenção da ordem.
Nota-se que além das atribuições do Oficial de Justiça especificadas na lei processual, cada Estado possui em seu Código de Organização Judiciária as disciplinas pertinentes a este cargo.
Assim, o Oficial de Justiça trata-se de um verdadeiro mensageiro do Poder Judiciário.
3 DAS CLASSIFICAÇÕES DAS DESPESAS PROCESSUAIS E SUAS ESPÉCIES
O Código de Processo Civil, em seu artigo 19 até o artigo 35, tratam na sua seção sobre "Das despesas e multas". Da epígrafe ressalta que multas não são despesas processuais, mas sanções por ilícitos praticados no processo. Todavia, é claro que toda sanção de natureza pecuniária não deixa de constituir uma despesa. (20)
Tal entendimento é esposado por Pontes de Miranda (21), onde nos diz:
"As despesas compreendem as custas, os honorários dos advogados, as multas às partes...".
Do mesmo modo expressa Amaral dos Santos (22):
"despesas processuais compreendem todos os gastos que se fazem com e para o processo, desde a petição inicial até a sua extinção. São despesas inerentes ao processo, correspondentes aos atos do processo e devidas ao Estado, aos sujeitos da relação processual, tanto principais como secundários, auxiliares do juízo e a outras pessoas que colaboram no desenvolvimento daquela relação".
Contudo, despesas processuais é expressão genérica, e delas só se pode dizer, também em termos genéricos, que são gastos incorridos pelas partes no processo. (23)
Portanto, para um estudo detalhado, deve-se analisar as despesas processuais divididas em espécies, a saber: a) taxa judiciária; b) despesas processuais de natureza remuneratória; c) despesas processuais de natureza indenizatória, d) multas.
Todavia, pelo objetivo do trabalho serão estudadas tão-somente a taxa judiciária e as despesas de natureza remuneratória.
3.1 Taxa judiciária
Taxa é espécie do gênero tributos. Na qual o artigo 3º do Código Tributário Nacional, dispõe que:
"Art. 3 - Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada".
Espécies de tributo são: a) imposto; b) contribuições; c) taxas. Não cabe aqui analisar cada um dos elementos, em entrar na discussão acerca da existência ou não de outras espécies tributárias. (24)
Observa-se que o principal objetivo é analisar a subespécie de taxas, que são taxas judiciárias.
No entanto, antes de definir taxas judiciárias, demonstra-se o ensinamento de Roque Antônio Carrazza (25), onde em sua obra define a expressão "taxas":
"De um modo geral, porém, tem-se entendido que a taxa é uma obrigação ex lege que nasce da realização de uma atividade estatal relacionada, de modo específico, ao contribuinte, embora muitas vezes por ele não requerida ou, até mesmo, sendo para ele desvantajosa".
Complementa ainda que:
"É preciso que o Estado faça algo em favor do contribuinte, para dele poder exigir, de modo válido, esta particular espécie tributária".
Agora, após a definição de taxas, podemos passar ao significado da expressão "taxa judiciária", na qual o Humberto Theodoro Júnior (26) demonstra que:
"São custas as verbas pagas aos serventuários da Justiça e aos Cofres Públicos, pela prática de ato processual conforme a tabela da lei ou regimento adequado. Pertencem ao gênero tributos, por representarem remuneração de serviço público".
Assim, do mesmo modo Valdir de Resende Lara (27) descreve que:
"taxa é a contraprestação de serviço público, ou de benefício feito, posto à disposição, ou custeado pelo Estado em favor de quem a paga, ou se este, por sua atividade, provocou a necessidade de criar-se aquele serviço público".
3.2 Despesas processuais de natureza remuneratória
Como já dito, despesas processuais é termo genérico que compreende segundo Celso Agrícola Barbi (28), as "custas propriamente ditas, fixadas nos Regimentos, e também honorários de peritos e assistentes de peritos e assistentes técnicos, e intérpretes, e a indenização às testemunhas". Todavia Pontes de Miranda (29) afirma que, "não se incluem como despesas processuais o pagamento de pareceres de jurisconsultos de que lançou mão a parte para seu esclarecimento ou efeito de melhor tratamento em público da matéria".
As despesas processuais podem ser classificadas, tendo em vista a sua natureza jurídica, em remuneratórias e indenizatórias. Sendo a primeira deste item.
As custas cobradas de acordo com o respectivo Regimento nada mais do que a remuneração devida ao serventuário da justiça pelo andamento do processo, com a realização dos atos procedimentais que lhe competem. É por isto que "como custas não se contam, entre outras, as despesas referentes a honorários de advogado, honorários de perito, indenização devida a testemunhas, dentre outros". (30)
Segundo De Plácido e Silva, em sua obra Vocabulário Jurídico (31), no verbete custas diz o seguinte:
"...são despesas do processo ou os encargos decorrentes dele, desde que fixados ou tarifados em lei. Serve, assim, de designativo geral para determinar toda sorte de despesa processual autorizada em lei, tenha a denominação própria, ou das denominações especiais de comissões, percentagens, emolumentos, rasas".
Entretanto na obra Enciclopédia Saraiva de Direito, verbete emolumentos, descreve que:
"...é empregado para indicar a retribuição concedida a uma pessoa, além do vencimento normal pelo exercício de seu cargo, destinando-se via de regra, aos serventuários públicos".
De outro lado os honorários "se distinguem de emolumentos, pagamento devidos por atos de autoridade pública ou de serventuários da Justiça" (32).
Todavia, consideram-se custas as despesas com atos judiciais praticados em razão do ofício e especificados nas tabelas das Corregedorias, compreendendo autuação, expedição e preparo dos feitos. E, consideram-se emolumentos as despesas com atos extrajudiciais em razão do ofício próprio.
4 Das PREVISÕES legais e seu conflito na prática processual
4.1 Do Código de Processo Civil
Como norma geral, o artigo 19, caput, do Código de Processo Civil, dispõe:
"Art. 19 - Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até a sentença final; bem ainda, na execução, até plena satisfação do direito declarado pela sentença".
No entanto, genericamente, despesas processuais, são todos os gastos, reembolsáveis ou não, despendidos pelas partes para a propositura e andamento do processo, tais como as custas judiciais, os emolumentos dos serventuários, honorários referentes à confecção de perícias, avaliações e traduções, o pagamento de diligência dos oficiais de justiça, o pagamento de condução e das diárias das testemunhas, dentre outros no regular andamento do feito (33).
Do mesmo modo ensina Ovídio A. Baptista da Silva (34), onde diz:
"Refere-se ao art. 19 a despesas judiciais, que é conceito mais amplo do que custas judiciais. São despesas judiciais, que não são custas, por exemplo, os honorários de advogado, a taxa judiciária, além de outras como o depósito prévio exigido para a ação rescisória pelo art. 488, II, do Código de Processo Civil. Os pareceres de peritos e jurisconsultos, incluídos por PONTES DE MIRANDA como despesas judiciais, segundo diz com razão, não devem ser considerados despesas judiciais, no sentido de virem a ser restituídas pelo vencido".
Contudo, o nosso Código de Processo Civil, em seu artigo 27, estabelece alguns privilégios sobre o artigo supracitado, vejamos:
"Art. 27 - As despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento do Ministério Público ou da Fazenda Pública, serão pagas a final pelo vencido".
Assim, a Fazenda Pública posicionada no pólo processual como parte ativa, em interpretação literal ou restritiva do texto acima, se insurge quanto à determinação pelo Juiz, do depósito de numerário provisório, requerido por certo auxiliares da Justiça, como no nosso caso, os Oficiais de Justiça e os peritos, invocando o disposto no artigo 27 do Código de Processo Civil.
Todavia, Pontes de Miranda (35) adverte que "a regra jurídica, vale dizer, a do art. 27, concerne a ações em que elas, as mencionadas pessoas jurídicas de direito público, não são partes, porque, se demandantes, ou intervenientes, é como partes que se tratam".
De modo contrário a esse entendimento, Ovídio A. Baptista da Silva, ensina:
"A norma, apesar de sua aparente simplicidade, não afasta certo problemas. As despesas decorrentes de atos processuais praticados a requerimento do Ministério Público, quando intervenha na causa como custos legis, não serão adiantadas, como determina o art. 19. Entretanto, os auxiliares da Justiça, compreendendo os avaliadores, peritos e oficiais de justiça, não estão obrigados a desembolsar as despesas que as respectivas diligências possam acarretar-lhe." (36)
A jurisprudência claramente tem se manifestado no mesmo sentido, senão veja:
"O art. 27, do CPC, estabelece que as despesas dos atos processuais efetuados a requerimento da Fazenda Pública serão pagas a final pelo vencido. Tais despesas, porém, não se confundem com o numerário que o Oficial de Justiça deve desembolsar para custear diligência de interesse da Fazenda. Para o custeio de tais atos o interessado deve adiantar o numerário suficiente, inclusive a Fazenda do Estado, dado que a isenção de que goza compreende somente custas, emolumentos e contribuições, não se estendendo às despesas das diligências externas que requerer a bem de seus interesses" (37).
Continuando:
"Ordenada a perícia pelo Juiz, de ofício, a autora, ainda que a Fazenda, não se pode esquivar do depósito prévio do salário do perito, exigência que não atenta contra a regra estabelecida pelo art. 27, do CPC, nem ofende o princípio consagrado pela isenção de custas, que milita em favor da Fazenda Pública. Tal isenção diz respeito apenas ao pagamento das custas, emolumentos e contribuições previdenciárias, não se estendendo às despesas das diligências externas, que requeira a Fazenda a bem de seus interesses ou determinadas ex-officio pelo Juiz" (38).
No entanto, sobre os honorários de perito o Superior de Tribunal de Justiça lançou a Súmula nº 232, que diz:
"Execução Fiscal – Fazenda Pública – Honorários de Perito – Depósito Prévio – Exigibilidade – Súmula. A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito".
Logo, sendo o perito profissional liberal (39), onde tais condições, ninguém lhe pode obrigar a antecipar despesas que incumbe ao interessado suportá-las; não será justo que o seu serviço somente venha a ser remunerado muito tempo após.
Agora, no caso do Oficial de Justiça, não pode se esquecer do privilégio que goza a Fazenda Pública consistente na dispensa de adiantar as despesas dos atos processuais, sendo estabelecida a Lei nº 6.830/1980, coloquial e abreviadamente chamada de "Lei das Execuções Fiscais", que diploma sobre a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública.
4.2 Da Lei das Execuções Fiscais
O artigo 39, caput, da Lei nº 6.830/80, dispõe o seguinte:
"A Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento as custas e emolumentos. A prática dos atos judiciais de seu interesse independerá de preparo ou de prévio depósito".
E complementa, a mesma Lei em seu parágrafo 1º:
"Se vencida, a Fazenda Pública ressarcirá o valor das despesas feitas pela parte contrária".
Esses dispositivos tratam das regras concernentes às despesas, devidas e indevidas, da Fazenda Pública, no processo de execução fiscal.
Desse modo, o referido dispositivo desonera-se a Fazenda Pública da obrigação de pagar as custas e emolumentos dos processos. "Observa-se que o alcance e a finalidade são amplos, abrangendo a extração e autenticação de peças dos autos, do ofício requisitório, ofícios endereçados às repartições públicas, tudo propiciando os meios técnicos que consigam amealhar os subsídios imprescindíveis à exigibilidade do crédito existente" (40).
Do mesmo modo, José da Silva Pacheco, em sua obra Comentários à Lei de Execução Fiscal (41), em específico ao artigo 39, nos ensina que:
"O art. 39 abrange a Fazenda Nacional, Estadual, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias. Não respondem delas custas dos atos do processo. Assim, não precisam prover as despesas concernentes aos atos que se realizam ou requerem no processo. Tampouco precisam fazer preparo de despesas futuras. Não tem de antecipar o pagamento das despesas dos atos processuais nem pagá-las posteriormente. Elas, simplesmente, não são devidas."
E complementa:
"Os emolumentos dos serventuários, igualmente, não são devidos pela Fazenda Pública. Assim, não há de pensar em pagamento de escrivão, escrevente, oficial de justiça, avaliador, depositário judicial, contador etc."
Contrariamente ao texto supracitado, podemos ver a decisão exarada pelo Juiz Antônio de Pádua Ferraz Nogueira (42), onde diz:
"Na autenticação de peças do processo de executivo fiscal, incide uma contribuição, a ser paga pela parte interessada, a título de compensação pelo ato. Não se trata de despesa processual lato sensu, mas de específico ato processual prestado pelo serventuário ou pela serventia. É, pois, típico emolumentos, que, no caso, seria devido a cartório oficial. Está, consequentemente, isenta a Fazenda Pública do seu pagamento ex vi do artigo 39 da Lei 6.830/80"
No entanto, a discussão está em torno do aspecto de se a isenção concedida a Fazenda Pública pela legislação, alcança também as diligências necessárias para a prática de atos pelo Oficial de Justiça, mais especificadamente, despesas com condução.
Ressalta-se que a matéria mais alegada na defesa desse "suposto" direito da Fazenda Pública é a falta de previsão orçamentária, que é evidente no caso de ente público.
Assim, o Desembargador Telmo Cherem (43), em matéria análoga ressaltou:
"Administrador criterioso, efetivamente empenhado na cobrança de seus créditos fiscais, já teria, de a muito, previsto as indigitadas despesas do orçamento anual, provendo-se da dotação orçamentária.
A responsabilidade pela falta de previsão orçamentária e as conseqüências dela resultantes não pode, evidentemente, recair sobre o oficial de justiça, que tem o dever de zelosamente, cumprir os mandados a eles confiados, mas que nenhuma obrigação tem de financiar a prática dos atos judiciais de interesse do Estado. Seria sumamente injusto."
Nota-se que o presente discurso de falta de previsão orçamentária já foi superada, pois atualmente existe a tal previsão.
De outro lado, em decisão exarada pelo Tribunal de Justiça, o Desembargador Eli R. de Souza (44), descreve:
"...Entretanto, a isenção concedida à Fazenda pela Lei de Execução Fiscal não alcança as despesas necessárias às diligências para a prática de atos processuais externos pelo Oficial de Justiça. Como estas despesas não traduzem qualquer remuneração pela prática do ato judicial, mas o próprio custeio da diligência não se encartam no âmbito das custas e emolumentos devidas às serventias. Não seria justo obrigar o oficial de justiça retirar à sua manutenção e da família, numerário para adiantar, em prol do Estado, o pagamento das despesas com a execução de ato processual..."
Do mesmo modo o Humberto Theodoro Júnior (45), quando se refere a isenção em causa, nos diz:
"..se aplica aos atos custeados pela Justiça e não pode corresponder à obrigação de que funcionários custeiem com recursos próprios despesas extraordinárias, como transporte e remoção de bens penhorados, por exemplo."
No mesmo diapasão, vejamos outra decisão, proferida pelo Ministro Moreira Alves (46), onde se manifestou:
"...o funcionário reconhecidamente remunerado de forma deficiente (aliás, pela Agravante), não se compreende deva ela adiantar do próprio bolso as despesas para, ao depois – em prazo exclusivo talante da exeqüente – ser ressarcido em importe já totalmente defasado. (...)... o artigo 27 do Código de Processo Civil como o artigo 39 da Lei n.º 6.830/80 não abrangem as despesas de condução dos Oficiais de Justiça. O conceito de ‘custas e emolumentos’ de que fala o artigo 39 da Lei n.º 6.830/80 e o termo ‘despesas dos atos processuais’ do estatuto processual não têm o alcance pretendido pela exeqüente, pois se referem tão-somente aos atos de responsabilidade da Serventia, não a atos exteriores do processo.
Ainda que se dê aos artigos 27 do Código de Processo Civil e 39 da Lei n.º 6.830/80 a interpretação de que o privilégio da Fazenda abarca toda e qualquer despesa com ato processual, esse privilégio (que tem custo a ser arcado por alguém) não pode determinar, inexistindo qualquer lei a respeito, que o Oficial de Justiça suporte o seu ônus temporário, ou, ato mesmo definitivo."
Podemos ver a decisão do Ministro Milton Luiz Pereira (47), onde descreve:
"Se a interpretação por critérios tradicionais conduzir a injustiça, incoerências ou contradição, recomenda-se buscar o sentido eqüitativo, lógico e acorde com o sentimento geral. Custas e emolumentos, quanto à natureza jurídica, não se confundem com despesas para o custeio de atos decorrentes do caminhamento processual. O oficial de justiça ou o perito não estão obrigados a arcar, em favor da Fazenda Pública, com as despesas necessárias para a execução de atos judiciais"
Desta maneira, o Superior Tribunal de Justiça, editou a Súmula nº 190, que traz:
"Na execução fiscal, processada perante a Justiça Estadual, cumpre à Fazenda Pública antecipar o numerário destinado ao custeio das despesas com o transporte dos oficiais de justiça".
"Ementa: - PROCESSO CIVIL. UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ARTIGO 39 DA LEI N.º 6.830, DE 1980. EXECUÇÃO FISCAL. DESPESAS COM TRANSPORTE DE OFICIAL DE JUSTIÇA.
Na execução fiscal, a Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento de custas e emolumentos; já as despesa com transporte dos oficiais de justiça, necessárias para a prática de atos do cartório, não se qualificam como custas ou emolumentos, estando a Fazenda Pública obrigada a antecipar o numerário destinado ao custeio dessas despesas, Uniformização de jurisprudência acolhida no sentido de que, na execução fiscal, a Fazenda Pública está obrigada a antecipar o valor destinado ao custeio das despesas de transporte dos Oficiais de Justiça."
Incidente de Uniformização de Jurisprudência em RMS n.º 1.352/SP, Relator Exmº Ministro ARI PARGENDLER, DJ de 19.5.97.
No mesmo aos entendimentos expendidos, temos a decisão proferida pelo Desembargador Ulysses Lopes (48), onde diz:
"...deve a Fazenda Pública ressarcir o numerário das despesas de condução somente quando demonstrado nos autos pelo meirinho o efetivo pagamento delas. Faço, porém, por atenção ao sentido de justiça, mais uma ressalva. Se a despesa para cumprimento do mandado for vultuosa e do valor dela não puder despender, ainda que temporariamente, o oficial de justiça, aí sim, e somente em tal hipótese, deverá a Fazenda Pública antecipar o numerário respectivo, desde que resta devidamente comprovada nos autos a sua necessidade.
Por isso, a fim de evitar possíveis abusos e também em nome do encaminhamento célere do processo, sempre cumprirá ao juiz com prudente arbítrio, aferir a vultosidade da despesa a justificar a antecipação. Deverão ser por ele consideradas as distâncias a serem percorridas para a realização da diligência, os gastos com eventuais remoções de bens, etc. Enfim deverá ser analisada a real necessidade dos gastos do oficial de justiça no exercício de seu mister."
Complementa, ainda que:
"...não pode perder de vista o disposto no inciso I do artigo 8º da Lei n.º 6830/80, "Lei das Execuções Fiscais"".
Conforme salientado pelo Desembargador Ulysses Lopes, podemos ver in verbis o que dispõe o artigo 8º, em seu inciso I da referida lei:
"Art. 8 -...
...
I – a citação será feita pelo correio, com aviso de recepção, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma;"
Para melhor demonstrar o alcance do referido inciso disposto no artigo 8ª, demonstra o comentário exarado por José da Silva Pacheco (49), descreve:
"Se a Fazenda ou a autarquia a indicar, expressamente, na petição, ou se houver omissão quanto a indicação de qualquer forma, faz-se a citação pelo correio, com aviso de recepção.
...
O serviço postal tem duas modalidades de correspondência registrada de interesse para a hipótese: de registrado com aviso de recepção (AR) e a de registrado de mão própria (Ministério Público). A Lei n.º 6830/80 elegeu o tipo AR, como, aliás, já o havia feito o art. 223 do Código de Processo Civil e o art. 841, § 1º da CLT".
Esse também é o ensinamento de Odmir Fernandes (50), onde diz:
"A citação postal foi adotada como regra para os processos de execução fiscal, na forma do art. 8º, I da LEF."
E salienta:
"A Fazenda Pública pode, no entanto, requerer que a citação seja feita por oficial de justiça."
Pelo exposto, pode-se ver que não são todos os casos que se aplicam a súmula n.º 190 do Superior Tribunal de Justiça, pois dependendo o caso pode ser utilizado o correio, cabendo ao representante da Fazenda Pública, bem como ao Juiz escolherem em análise ao caso concreto, qual a melhor medida.
Assim, finalizando o presente item, notamos que "a Fazenda Pública está dispensada do pagamento apenas das custas judiciais, inclusive preparo e emolumentos (autenticação, certidões, registro de arresto ou penhora, avaliador etc.), mas responde por salários de perito, despesas de condução do Oficial de Justiça(não em todos os casos como exposto acima) e outras"
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