sábado, 27 de junho de 2009

A LEI 9.421 DE 24/12/1996, SUA REGULAMENTAÇÃO E OS OFICIAIS DE JUSTIÇA AVALIADORES

A LEI 9.421 DE 24/12/1996, SUA REGULAMENTAÇÃO E OS OFICIAIS DE JUSTIÇA AVALIADORES

1. Introdução

Tendo em vista a criação das carreiras dos servidores do Poder Judiciário da União pela Lei 9.421, DOU de 26/12/1996, o enquadramento dos servidores então ativos e a regulamentação administrativa no âmbito dos respectivos órgãos superiores que o compõem, como, p. ex., a Resolução Administrativa no 207, do Conselho da Justica Federal, de 05/02/1999, no âmbito da Justiça Federal de 1o e 2o graus e, mais recente, na Justiça do Trabalho, a Resolução Administrativa no 833/2002 do Tribunal Superior do Trabalho, de 07/02/2002, algumas indagações surgiram quanto a subsistência do cargo de oficial de justiça avaliador nos quadros de servidores do Poder Judiciário da União.

Indagou-se: O cargo ainda existe? Persiste o seu provimento de forma isolada em relação aos demais servidores do Judiciário Federal? Podem as atribuições do oficial de justiça serem acometidas a um serventuário judicial sem especialização? Pode o oficial de justiça exercer atividades estranhas as atribuições que lhe são conferidas em Lei?

Tais questões causaram, ao mesmo tempo, surpresa e interesse pelo assunto na esfera do Direito Administrativo, isto em decorrência da relevância deste serventuário especializado para o bom andamento dos feitos e o eficaz cumprimento das decisões judiciais na execução.

2. Breves antecedentes históricos

O prof. Alfredo Buzaid, em seu parecer contido na obra "Oficial de Justiça - Teoria e Prática, sob autoria de Gerges Nary, Edição Universitária de Direito, 4ª ed., 1985)", indica que a figura do oficial de justiça remonta, historicamente, aos Direitos Romano (como apparitores), Hebraico (como ajudantes dos suphetas/juízes) e floresce na aurora das legislações medievais germânica (como Botem, Buttel), portuguesa (como sagio/saion/meirinho) e, por fim, na francesa (como hussiers).

No Brasil, foi a legislação do Império que fez a primeira menção aos oficiais de Justiça, cuja nomeação e destituição era livre pelos Juizes de Direito e de Paz.

Proclamada a República, os códigos processuais, por influência do Direito Português, passaram a prever expressamente a figura do oficial de justiça, aos quais, dentre outras atribuições, incumbiu-se precipuamente de executar "(...) pessoalmente as citações, prisões, penhoras, arrestos e mais diligências próprias do seu ofício, (...)", (conf. art. 143 do Código de Processo Civil Brasileiro).

No mencionado parecer, ressaltou o Prof. Alfredo Buzaid, cuja transcrição não podemos omitir, que:

"Embora seja executor de ordens judiciais, conferiu-lhe a lei uma prerrogativa de suma importância no processo; o poder de certificar (cf. José da Silva Pacheco, Curso Teórico e Pratico do Processo Civil, vol. I, pág. 210). Do poder de certificar se diz que está ínsito na autoridade suprema do Estado (João Mendes Júnior, Exposição Preliminar das Bases para a Reforma Judiciária, pág. 290). Quem o exerce não pode ser havido como funcionário de condição subalterna. É um órgão de fé pública, cujas certidões asseguram o desenvolvimento regular e normal do processo. A circunstância de terem os Oficiais de Justiça maior liberdade de ação no direito alemão, italiano e francês e acentuada dependência ao Juiz no direito brasileiro não lhes diminui a dignidade da função, que reside verdadeiramente na fé publica dos atos que praticam." (ob. supra citada, pág. 15)

3. A Lei 9.421 de 24/12/1996 e a implementação do enquadramento dos servidores realizado em 2002 pelo Tribunal Superior do Trabalho

A Lei 9.421 de 24/12/1996, que no seu art. 1o criou as carreiras dos servidores do Poder Judiciário da União, aqui incluso o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, conferiu as seguintes denominações às carreiras e cargos: “auxiliar judiciário”, “técnico judiciário” e “analista judiciário”, constituídas de cargos de provimento efetivo, de mesma denominação, estruturada em classes e padrões, nas diversas áreas de atividade (conf. o anexo I da lei).

O referido diploma legal, no art. 4o, determinou a transformação dos antigos cargos na forma estabelecida pelo seu anexo III (Tabela de Enquadramento), isto fazendo com a expressa disposição de serem respeitadas "as respectivas atribuições e requisitos de formação profissional, observando-se a correlação entre a situação então existente e a nova situação".

Mais adiante, no §3o do art. 4o, explicitou o legislador que as disposições que criaram os novos cargos são também aplicáveis aos cargos de oficial de justiça avaliador "e demais cargos de provimento isolado, observados no enquadramento os requisitos de escolaridade e demais critérios estabelecidos nesta Lei".

No art. 19 da multicitada lei, remeteu-se ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Conselho da Justiça Federal, ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, no âmbito de suas competências, baixar os atos regulamentares previstos na lei, bem como as instruções necessárias a sua aplicação, buscando a uniformidade de critérios e procedimentos.

No âmbito da Justiça Federal de 1o e 2o graus, tal enquadramento se processou em 05/02/1999, mediante a Resolução Administrativa do Conselho da Justiça Federal, sob o no 207/1999, publicada no DJU em 18/02/1999.

Daremos ênfase a regulamentação da matéria perante o Judiciário Trabalhista por ser ela mais recente., embora tenha sido elaborada nos mesmos termos da Justiça Federal.

O Tribunal Superior do Trabalho, em sua composição plena, aprovou, através da Resolução Administrativa no 833/2002, publicada em 26/03/2002 no DJU, a regulamentação dos cargos providos e vagos, e o enquadramento por área de atividade e especialidade dos servidores da Justiça do Trabalho nas carreiras judiciárias, fixando em seu art. 11, que os Tribunais Regionais do Trabalho, no prazo de 90 dias a contar da data de publicação, deveriam realizar o enquadramento na forma preconizada pela Lei 9.421/96.

Os Tribunais Regionais do Trabalho assim procederam, podendo-se citar, p. ex., o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região - MG que, pelo seu Órgão Especial, expediu a Resolução Administrativa no 80/2002, aprovando a proposição da Diretoria Geral (TRT/DG/15-2002) e promovendo o enquadramento por área de atividade e especialidade dos servidores da Justiça do Trabalho da Terceira Região nas carreiras judiciárias criadas pela Lei 9.421/96.

A mencionada resolução administrativa do TRT da 3ª Região adotou ainda o quadro anexo à RA no 833/2002 do TST, que estabeleceu a relação de correspondência entre a situação anterior e a atual dos ocupantes do cargo de oficial de justiça avaliador no âmbito da Justiça do Trabalho, conforme abaixo compilamos de forma parcial:

TRANSFORMAÇÃO E ENQUADRAMENTO DE CARGOS POR ÁREA DE ATIVIDADE E ESPECIALIDADE – ANEXO DA R.A. 833 /2002 - TST

Nível superior

Situação anterior:
-Grupo: Apoio judiciário;
-Nível: Superior;
-Categoria Funcional: Técnico Judiciário, Técnico Judiciário – Área fim, Técnico Judiciário – área meio, Oficial de justiça avaliador, Inspetor de seguranaça judiciário, Taquígrafo judiciário.

Situação nova:
-Carreira/Cargo: Analista Judiciário
-Área: Judiciária, Administrativa, Judiciária, Administrativa, Judiciária (Especialidade: Execução de Mandados), Serviços Gerais (Especialidade: Segurança e Transporte), Apoio Especializado (Especialidade: Taquigrafia).

No quadro de transformação e enquadramento, aqui parcialmente transcrito, tem-se a seguinte correlação: o cargo de oficial de justiça avaliador, na "situação anterior", era posicionado no grupo de apoio judiciário, nível superior. Na denominada "situação nova", este servidor tem seu enquadramento na carreira e cargo de analista judiciário, da área judiciária, com a especialidade de execução de mandados.

4. Persiste o cargo de oficial de justiça no âmbito do Judiciário Federal?

Como visto, no âmbito do Poder Judiciário da União, o cargo de oficial de justiça avaliador foi transformado e renomeado para analista judiciário com a especialidade de execução de mandados, contudo, embora não mais detenha a denominação de oficial de justiça na esfera administrativa, tal denominação, e a respectiva descrição de atividades, remanescem na legislação processual, seja no âmbito do Processo Civil (art. 143) como no Processo do Trabalho (art. 721, 880 e 883 da CLT), permanecendo aos ocupantes do cargo renomeado o encargo legal e essencial de execução de mandados judiciais.

Veja-se que, em razão da citada legislação processual, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, também submetido as determinações da Lei 9.421/96, manteve em seus quadros funcionais a denominação de oficial de justiça, tanto que a Lei no 10.417, de 05/04/2002, ao instituir a gratificação por execução de mandados especifica:

Art. 1o Fica instituída Gratificação por Execução de Mandados, devida aos servidores ocupantes do cargo de Analista Judiciário - Oficiais de Justiça - Área Judiciária - Especialidade Execução de Mandados, do Quadro de Pessoal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, pelas peculiaridades decorrentes da integral e exclusiva dedicação às atividades do cargo e riscos a que estão sujeitos.
(...)

Portanto, as atividades acometidas pela legislação processual aos oficiais de justiça são, no âmbito do Poder Judiciário da União, reservadas aos ocupantes do cargo de analista judiciário, com a especialidade de "execução de mandados".

Melhor teria sido que a Lei 9.421/96 não tivesse modificado a denominação do cargo de oficial de justiça avaliador, permanecendo para este cargo específico a identidade de denominações entre as Justiças Federal e Estadual, como se observava outrora.

5. O "analista judiciário executor de mandados" pode ser substituído em suas atividades por outro serventuário que não tenha o mesmo enquadramento funcional, isto ao talante do administrador público?

A resposta é negativa, porque fica o administrador público jungido ao cumprimento do que dispõe a Lei 9.421/96 e o seu regulamento no âmbito dos órgãos que compõem o Judiciário Federal, no caso analisado, a Resolução Administrativa no 833/2002 do TST, no âmbito da Justiça do Trabalho.

O “analista judiciário executor de mandados” somente pode ser substituído em suas funções por outro serventuário que tenha o mesmo enquadramento funcional, isto em decorrência de sua expressa especialidade no quadro de carreiras e cargos, que lhe reserva o cumprimento de atribuições específicas, eis que reservadas em Lei (arts. 143/CPC e arts. 721, 880 e 883/CLT).

A definição do que são as especializações acometidas aos diversos cargos que compõem o quadro de servidores do Judiciário Federal, foi explicitada no art. 2o da RA 833/2002 do TST, "in verbis":

“Art. 2o Para os fins de que trata esta resolução, devem ser observadas as definições dos seguintes termos básicos utilizados na Lei no 9.421/96:
(omissis)
X- Especialidades - são divisões das áreas de atividade quando for necessária, para o exercício das atribuições, formação especializada, por exigência legal, ou habilidades especificas a critério da Administração.”

Os analistas judiciários não especializados que, eventualmente, tenham sido designados para o exercício das atividades acometidas aos "analistas executores de mandados" (antigos oficiais de justiça avaliadores), são precários no exercício da atividade ou, como bem traduz o termo latino: "ad hoc", "... nomeado para certo fim processual ou legal, substituto eventual", conforme traduz Pedro Nunes "in" "Dicionário de Tecnologia Jurídica" - 11a ed., vol. I, pág. 63.

Outro não é o entendimento legal contido no §5o do art. 721 da CLT, que chancela ao Juiz atribuir a realização do ato privativo do oficial de justiça a outro serventuário somente na hipótese de ocorrer a falta ou o impedimento daquele, o que reforça a especialidade e o caráter privativo do cargo.

6. O "analista judiciário executor de mandados" pode ser designado para o cumprimento de atividades estranhas a sua especialidade?

Primeiro, há que se ter em mente que os ocupantes de cargos com especialidades se submeteram a concursos públicos, com a exigência específica de serem bacharéis em direito ou médicos, psicólogos, engenheiros etc., almejando portanto um cargo específico e especializado, como no caso em análise, oficial de justiça avaliador, antes da alteração legislativa e, após a edição da Lei 9.421/96, analista judiciário, área judiciária, com especialidade de execução de mandados.

Ora, se sob tais condições prestaram seus concursos e assim foram nomeados e empossados nos respectivos órgãos públicos, não podem ser desviados para cargos distintos enquanto existir na estruturação administrativa a previsão de seus cargos e de suas atribuições especializadas.

Hely Lopes Meirelles, "in" "Direito Administrativo Brasileiro", 24ª edição, com a sua notória maestria observou, ao analisar os "Direitos do titular do cargo", que:

"Os direitos do titular do cargo restringem-se ao seu exercício, as prerrogativas da função e ao subsidio ou aos vencimentos e vantagens decorrentes da investidura, sem que o servidor tenha propriedade do lugar que ocupa, visto que o cargo é inapropriável pelo servidor, daí por que a Administração pode suprimir, transformar e alterar os cargos públicos ou serviços independentemente da aquiescência de seu titular, uma vez que o servidor não tem direito adquirido a imutabilidade de suas atribuições, nem a continuidade de suas funções originárias. A lei posterior pode extinguir e alterar cargos e funções de quaisquer titulares - vitalícios, estáveis e instáveis.

(...)

Enquanto subsistir o cargo, como foi provido, seu titular terá direito ao exercício nas condições estabelecidas pelo estatuto; mas, se se modificarem a estrutura, atribuições, os requisitos para seu desempenho, licitas são a exoneração, a disponibilidade, a remoção ou a transferência de seu ocupante, para que outro o desempenhe na forma da nova lei. O que não se admite e o afastamento arbitrário ou abusivo do titular, por ato do Executivo, sem lei que o autorize.”(ob. citada, pág. 377/378)

Ouso observar, complementando o mestre com o devido respeito, que no caso de redistribuição do servidor público, estabelece o "caput", do art. 37, da Lei 8.213/1990, que se observarão os seguintes preceitos:

"(omissis...)
III - manutenção da essência das atribuições do cargo;
IV - vinculação entre os graus de responsabilidade e complexidade das atividades;
V - mesmo nível de escolaridade, especialidade ou habilitação profissional;
(omissis...)"

Tais preceitos devem ser observados mesmo se a redistribuição decorrer do "ajustamento de lotação e da força de trabalho às necessidades do serviço, inclusive nos caso de reorganização, extinção ou criação de órgão ou entidade", conforme o §1o, art. 37, Lei 8.213/90).

O mencionado dispositivo leva a conclusão de que a Administração Pública, no exercício de seu Poder Discricionário e Hierárquico de reorganizar a sua estrutura administrativa e força de trabalho, deverá respeitar aos ocupantes dos antigos cargos, no mínimo, a essência de suas atribuições anteriores, enquadrando-os aos novos cargos de forma compatível com a situação funcional pretérita de cada um.

Observa-se que foi exatamente isto que resguardou a Lei 9.421/1996, no seu art. 4o, cujas salvaguardas foram repetidas pelo art. 3o da Resolução Administrativa no 833/2002 do TST.

Assim, enquanto houver no quadro de carreiras a previsão do cargo de analista judiciário, da área judiciária, especializado na execução de mandados, qualquer alteração de suas atribuições específicas representará um desvio de função a ser reparado, seja no âmbito administrativo (art. 104 e segs. c/c 114 da Lei 8.213/90) ou, judicialmente, pela via do mandado de segurança (art. 5o - LXIX da CF).

Cabe ressaltar que, tal cargo, tendo sido criado por lei ordinária, somente por esta via poderá ser suprimido ou alterado.

7. Conclusão

Assim, tendo analisado sucintamente os aspectos da Lei 9.421/1996, no tocante aos antigos oficiais de justiça avaliadores, e a sua regulamentação no âmbito dos diversos órgãos superiores que compõem o Poder Judiciário da União, mais recentemente na Justiça do Trabalho, podemos concluir que:

a) Persistem as atribuições do oficial de justiça avaliador no âmbito do Judiciário Trabalhista, cujo cargo foi renomeado para analista judiciário da área judiciária, especializado na execução de mandados, aos quais são incumbidas as atividades previstas na legislação processual, lá acometidas aos denominados "Oficiais de Justiça";

b) Tratando-se de um cargo que, anteriormente, era de provimento isolado (oficial de justiça avaliador) e sendo hoje um cargo com especialização (execução de mandados), o seu ocupante somente pode ser substituído por outro servidor com a mesma especialização no quadro de carreiras, ressalvando-se, entretanto, a substituição temporária, "ad hoc", na hipótese restrita do art. 721 da CLT;

c) Não pode o ocupante do cargo de "analista judiciário executor de mandados” ser designado para o cumprimento de atribuições distintas e incompatíveis com sua especialização, isto enquanto persistir a previsão legal de seu cargo especializado, sob pena de se acarretar um desvio de função;

d) A inobservância administrativa dos preceitos legais que regulam a atividade funcional dos "analistas judiciários executores de mandados" atrairá a correção do ato eivado de nulidade, seja pela via administrativa ou judiciária.


Texto confeccionado em 10/03/2003, por
(1) André Luiz Guedes Fontes

Atuações e qualificações
(1) Advogado trabalhista militante, com atuação voltada para assessoria empresarial

E-mails
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