sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Morte em cruzeiro - MPF denuncia médica sérvia por homicídio culposo


09/09/10 – Morte em cruzeiro - MPF denuncia médica sérvia por homicídio culposo

Falha no diagnóstico e no atendimento médico teriam causado a morte de estudante de direito Isabella Baracat Negrato por aspiração de vômito

O Ministério Público Federal em São José dos Campos denunciou a médica sérvia Jasna Tankosic pelo crime de homicídio culposo na morte da estudante de direito Isabella Baracat Negrato. Para a procuradoria da República, o quadro de coma alcoólico da estudante, que morreu a bordo do navio MSC Ópera, em 19 de dezembro de 2008, não foi diagnosticado corretamente pela profissional, que atendeu a jovem como um simples caso de intoxicação e não adotou os procedimentos médicos corretos, levando-a à morte por asfixia causada por aspiração de vômito.

Homicídios habitualmente não são de atribuição do MPF mas, nos casos de crimes contra a vida ocorridos no mar territorial e no espaço aéreo brasileiro, a competência é da Justiça Federal. O caso de Isabella está na Justiça Federal de São José dos Campos, que detém a jurisdição sobre o município de São Sebastião, em cujo porto o navio estava fundeado.

Segundo a denúncia, de autoria do procurador da República Angelo Augusto Costa, Isabella e a amiga Lissa Curado, também estudante de direito, participavam de um cruzeiro no navio MSC Ópera, voltado para estudantes universitários. Na véspera da morte, entre 17h do dia 18 e 2h30 do dia 19, Isabella e a amiga assistiram a shows no deck do navio e consumiram bebidas alcoólicas. Entre um show e outro, as amigas dormiram por poucas horas em sua cabine.

No dia seguinte, elas acordaram às 11h e tomaram café. Ficaram no restaurante até 12h30 e foram para a piscina onde dividiram uma garrafa de champagne. Isabella teria bebido mais duas cervejas. Em torno de 16h, Lissa saiu para atender uma chamada no celular e deixou a amiga conversando com um rapaz desconhecido.

Meia hora depois, quando voltou, Lissa encontrou Isabella sentada em uma cadeira, quase inconsciente e coberta de vômito. A enfermaria foi acionada e Isabella foi levada ao local em uma cadeira de rodas por monitores do navio. Segundo a amiga, Isabella não conseguia se comunicar e os funcionários do navio afirmam que ela estava inconsciente.

Por volta de 17h10, a médica Jasna começou o atendimento médico. Diante da negativa de que ela havia usado drogas, a profissional iniciou o procedimento padrão para intoxicação alcoólica e administrou glicose na veia de Isabella, que era assistida por Lissa, que segurava sua cabeça. A jovem vomitou mais.

A médica orientou, então, que Lissa voltasse com Isabella para a cabine, pois ela dormiria a noite inteira. Lissa negou-se e ficou na enfermaria. Pouco depois, o maxilar da vítima travou e Jasna colocou uma máscara de oxigênio na paciente e mandou que a amiga ligasse para a família da estudante e perguntasse se ela sofria de epilepsia.

Por volta de 17h30, Isabella sofreu quatro crises convulsivas consecutivas e a médica pediu que a vítima fosse removida para um hospital, mas o quadro evoluiu para uma parada cardíaca. Jasna tentou reanimar a jovem, inclusive com desfibrilador, mas a vítima não reagiu às manobras de ressuscitação cardio-respiratória e faleceu às 19h10.

Segundo o laudo de exame de corpo de delito produzido pelo Instituto Médico Legal, Isabella estava em coma alcoólico, na concentração de 2 gramas por litro de sangue, e o médico legista apontou que a causa da morte foi “asfixia mecânica por aspiração de líquido (vômito)”.

A sindicância realizada pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo apontou que o atendimento emergencial da paciente foi inadequado, pois “as crises convulsivas não foram tratadas de maneira adequada”. Pelos sinais apresentados por Isabella, conclui-se que ela já estava em coma quando chegou ao centro médico do navio.

INTUBAÇÃO OBRIGATÓRIA - Quando um paciente se encontra em coma profundo, a ciência médica prevê que é obrigatória a intubação do paciente para proteger as vias aéreas. Como Isabella não foi intubada, ela aspirou o próprio vômito, causando as convulsões e a posterior parada cárdio-respiratória.

Segundo a denúncia, o centro médico do navio MSC Ópera possuía todos os instrumentos e medicamentos necessários para os procedimentos que poderiam salvar Isabella. Vistoria realizada no navio pelo Cremesp apontou que a embarcação possuía material e medicamentos para aspiração traqueal, intubação, ventilação e outros procedimentos que, adotados corretamente, poderiam ter salvo a estudante.

Para Angelo Costa, “é grave infração de dever de cuidado do médico em relação ao paciente não adotar, de imediato, os procedimentos necessários para a proteção das vias aéreas superiores diante de um quadro tão severo de coma”, e, portanto, houve uma “leviana confiança” de que não haveria a morte, “caracterizada pela imperícia qualificada por inobservância de regras técnicas especializadas da profissão médica”.

Na denúncia, o MPF considera que, devido sua formação médica, a acusada contribuiu para a morte, pois “embora tivesse à disposição todos os meios necessários para intervir no curso causal de maneira rápida e decisiva, confiou levianamente em que a adoção do procedimento padrão para os casos de intoxicação alcoólica levaria, por si só, a reversão do quadro extremamente grave de Isabella Bacarat Negrato.”

A médica Jasna Tankosic reside na Sérvia. O MPF requereu à Justiça Federal que o juiz expeça uma carta rogatória para que ela tome conhecimento da ação, caso ela venha a ser aberta. A denúncia foi oferecida no último dia 3 de setembro e está sob apreciação da 1ª Vara Federal de São José dos Campos.

Autos nº 2009.61.03.000591-0

Procuradoria da República no Estado de S. Paulo
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